Tudo o que é canto tem detector de metais aqui. Os hotéis, restaurantes, templos… Até para descer as escadarias que levam pro Ganges você passa por um detector. Se quiser. É, porque a escadaria tem muuuuitos metros de largura, com um único e surrado detector, sem ninguém para honrá-lo. Ou seja, o coitado fica lá se esgoelando sozinho e não dá conta nem de 1/10 do povo. Passa boi, passa boiada, literalmente.
A regra No 2 do meu manual de sobrevivência na Índia diz que mulheres não devem sair sozinhas à noite. Só que o programa mais “baladado” daqui é assistir as práticas ritualísticas na beira do rio, logo após o pôr do sol e/ou com o sol nascendo, o que significa sair à noite. A solução foi contratar um guia para me levar (uma guia, na verdade), que acabou incluindo visitas a alguns templos no passeio.
Bem bonita a cerimonia noturna (Aarti) no rio. Do barco eu conseguia ver 2 ghats (escadarias que levam à beira do rio), o que causava uma certa poluição sonora por um lado, mas matou a curiosidade de saber o que acontece em outras partes. A população de barcos era maior do que a da praia de Copacabana no reveillon do Rio. Quase todos a remo, feitos em madeira, ficavam encostados uns nos outros, formando uma só plateia, bem próxima da margem. À nossa frente, eram 7 altares idênticos, lado a lado, 7 sacerdotes que entoavam sons e faziam movimentos sincronizados com castiçais, piras e outros objetos, em sinal de oferenda aos deuses e ao seu rio sagrado. Tudo ao som de váaarios sinos tocando ininterruptamente no fundo.
O barato foi perceber que ao parar de “assistir”, eu me hipnotizei por aquela profusão de luzes e sons. Aí sim entendi o espirito da coisa. Ritual não é para se assistir, é para se sentir. Poderia ficar meditando ali por horas!!
Só que eu achei que a cerimonia que ia rolar ali era a de cremação… Achei, inclusive, que os “altares” eram pra isso :-S
“Você quer ver a cremação?”, minha guia perguntou. Respondi que sim, incorporando meu lado antropóloga.
O garoto começou a remar, passando por outras ghats, em geral, bem iluminadas e enfeitadas para as cerimônias. Mas, de repente, a energia pesou. Aquela ghat era sombria. Com clima de trevas mesmo, o próprio purgatório. Escura. Seus edifícios abandonados e mal cuidados eram todos cobertos de fuligem preta. Ao invés de uma grande escadaria, haviam alguns degraus e um barranco lamacento, com restos de flores e oferendas espalhados. Pilhas, muitas e muitas pilhas de madeira. E umas 6 ou 8 “fogueiras” espalhadas. Minha guia me explicou que apenas os familiares homens comparecem à cerimônia. E que demora em torno de 3 horas para se queimar um corpo. A cremação é encarada como um ritual de purificação da alma, o que fez bastante sentido pra mim. Por isso, monges, crianças e mulheres gravidas não são queimados. Estávamos bem perto da margem, olhei com atenção, mas não dava pra ver mais do que troncos de madeira, numa serie de fogueiras. Ela perguntou se eu queria descer pra ver de perto, mas me senti invadindo o espaço daquelas pessoas e decidi ficar por ali mesmo.
Amanhã, então, 5:15 da manhã na recepção, ok?