Na verdade, daqui pra frente serão váaaarios trechos de carro, com o mesmo motorista: Bilu. Foi ele que me pegou na estação de trem de Agra, mas tava tudo tão confuso que nem me dei conta de que era com ele que eu ia fazer a maior parte da viagem!!
Entrei no carro de manhã pra seguir caminho pra Fatehpur Sikri e dei bom dia e ele:
“Você não perguntou meu nome…” todo ressentido tadinho… Tentei corrigir o problema rapidamente, me expliquei e tal, e ele disse:
“Nós vamos passar os próximos 10 dias juntos!”
Aí que me dei conta… E segui me justificando porque, de fato, meu roteiro é muito longo e não consegui memorizar.
Bilu é compriiido… Magro, alto, com uma certa cara de garoto, mas todo compenetrado. Educado, gentil e, o que é muito importante aqui, com aspecto limpo. Ufa! Super bonzinho e faz tudo o que eu quero, hehe. “I’m a 24 hours driver, m’am” me diz sorrindo.
“You happy, me happy” rs
O primeiro percurso era de Agra para Jaipur, com uma parada para visitar a cidade abandonada de Fatehpur Sikri.
Bilu parou o carro no estacionamento e, de lá, eu deveria pegar um micro-ônibus do próprio monumento até a porta. Mas, antes, ele olhou pra mim e disse, como um pai que orienta um filho: “Quando você descer do ônibus vá direto pra porta da cidade. Você vai ser abordada por vários homens mas não deve falar com nenhum deles. Não olhe nem pra direita, nem pra esquerda. Caminhe reto!” Respirei fundo e liguei meu radar. Alerta.
Bom, a cidade foi construída pelo avô de Shah Jahan (Akbar) para ser a sede do império, mas precisou ser abandonada 14 anos depois de construída, simplesmente, por falta de água. É um passeio interessante mas não emociona.
Quando eu saí, os mesmos caras vieram me abordar e perguntavam se eu ia visitar a mesquita (na certa
para oferecer serviços de guia). No intuito de espantá-los, a única palavra que eu pronunciava era “Não”, com n maiúsculo.
Entrei no ônibus para voltar e fiquei ali, admirando aquela imponente construção uns 200 metros a frente. E desci do ônibus. Caminhei em sua direção, hesitante, sem saber se aquela era uma boa decisão e fui medindo a “temperatura” no caminho. O lugar era bem grande e muitos locais entravam e saiam pelos portões, gente simples. Havia uma muralha que cercava uma grande “praça”, numa linha Piazza San Pedro, no Vaticano.
Meninos disputavam a minha atenção para tentar me vender qualquer coisa e jogavam no meu colo toda e qualquer informação que tinham sobre o local, tentando fazer por merecer uma gorjeta. Fui “salva” por um senhor indiano de bengala e turbante, muito simpático e sereno. Ele me disse que eu precisava tirar o sapato para entrar na “praça”, mas que poderia guardá-lo na minha bolsa se não quisesse deixá-lo ali (sabe das coisas ele). Me apontou a mesquita exatamente do outro lado do terreno e explicou que ela era uma copia da mesquita de Meca. Hum…
O lugar era muito movimentado e tinha uma energia pesada. Turistas eram escassos. Fiquei um pouco tensa, sem saber se corria algum perigo ali, mas atraída pela imponência daquele monumento ao mesmo tempo. Respirei fundo e tirei os sapatos. Dei 3 passos e fui abordada por um homem que era uma mistura do Jack Sparrow com o Bin Laden… Rs Tinha um olhar forte e agia como o dono do pedaço. Não dei ouvidos e segui andando, tentando despistá-lo. Ele insistiu me acompanhando e disse, um pouco incomodado com a minha indiferença, que não queria dinheiro e só trabalhava ali (todos que te abordam querem dinheiro). Olhei pra ele. Ele fez perguntas sobre mim e respondi, andando, de forma evasiva, pedindo licença umas 3 vezes para seguir minha caminhada. Ele me orientou, então, a não caminhar em linha reta até a mesquita, mas sim acompanhando o muro, provavelmente para dar uma chance aos ambulantes que se dispunham ali sentados, de me venderem algo. Mas como tudo aqui é super cheio de simbolismos e significados, obedeci. Também achei que não era uma boa ideia desafiar uma figura daquela…
No caminho, passei por um mini cemitério, bem pesado, e cheguei perto de uma “casinha” de mármore branco que havia um pouco mais a frente. As pessoas se espremiam para entrar numa especie de fila. Fui chegando mais e mais perto para ver o que tinha ali. Já dentro do edifício, havia uma especie de varanda que o circundava. Cheguei mais perto, e um senhor que organizava a entrada colocou uma especie de chapéu de plástico na minha cabeça. Parecia um daqueles recipientes que se usa para lavar arroz. Imaginei que seria o equivalente a kipá dos judeus. Passando pela varanda, havia uma sala pequena, escura. As paredes eram de mármore recortado, vazado, como se fossem uma renda. No centro havia algo parecido a uma cama de um rei, dessas com os pés altos, que parecem 4 torres. Desconfio que era um túmulo. Em cima dele havia diversos tecidos coloridos sobrepostos e flores. As pessoas caminhavam em volta, num sentido único, e recebiam uma especie de barbante para amarrar na “renda” da parede. Fui acometida por um sentimento solene. Fiz um pedido, amarrei meu “barbante” e levei umas “abanadas” com uma especie de “espanador” gigante. Tomei meu caminho de volta com a sensação de dever cumprido.