E se a onça aparecer?

Floresta

Fui dormir apreensiva, pensando se realmente teria sido uma boa ideia optamos por uma expedição de 3 dias na floresta. O Marcelo disse que se encontrássemos uma onça, a única coisa que não poderíamos fazer era correr. “Por que, pra ela não atacar?”

“Pra não morrer cansada.” :-S

Acordei 1:30 da manhã com o Jan, meu namorado, se coçando sem parar. Tínhamos relaxado com o repelente e os mosquitos fizeram aquela festa. E tome pomada pra coceira, “do Oiapoque ao Chuí”, rs. Mas foi deitarmos na cama que veio o estrondo. Um barulho tão forte, tão forte, que parecia que a gente tava no meio de uma bateria de escola de samba. Mas era chuva! A mais forte que eu já vi na vida! E como se fosse possível, o barulho foi ficando mais e mais forte. Im-pos-sí-vel dormir. E seguiu o resto da noite toda: a chuva no telhado e a onça na minha cabeça. Cochilávamos quando o barulho enfraquecia, mas logo vinha outra “onda” implacável. E eu só pensando na gente entrando na floresta…. “Eu acho que o Ceará vai sugerir d’agente adiar a viagem pra amanhã… Mas se ele não disser nada eu vou sugerir. Olha essa chuva!”

De qualquer forma, tínhamos que estar prontos às 9. Levantamos, tomamos o último banho decente e, no café, perguntei à D. Glorinha se ela podia me levar a uma farmácia pra comprar um antialérgico pro Jan. Mas, na verdade, eu tava mais preocupada em comprar uma faca pra me defender da onça. Nem que fosse pelo efeito psicológico, hehe.

“No mercado dos pescadores tem”, disse o cara da farmácia. Encontrei uma que me pareceu perfeita. Grande o suficiente para uma defesa digna, rs, mas não tanto a ponto d’eu arrancar meu próprio dedo e com uma proteção pra lâmina.

A chuva deu uma trégua e Ceará apareceu pelo igarapé que dá na pousada com seu barquinho maroto.

“E esse tempo, heim Ceará?”

“Tem problema não… É assim mesmo…”

Respirei fundo… “Bora lá, então.”

Ceará: nosso guia e seu barco O Rio Negro não leva o nome à toa. É cor de Coca-Cola mesmo, desde a Colômbia, de onde traz matéria orgânica de folhas e troncos em decomposição, que colorem as águas, nem sempre calmas, como pudemos comprovar. No seu trecho mais largo, chega a aproximadamente 20 km, onde abriga o Parque Nacional de Anavilhanas, o maior arquipélago fluvial do mundo. Navegamos por entre as ilhas até a trilha pras grutas Madadá, nossa primeira parada. 1 hora e meia de caminhada depois… era legal, mas nada demais, vai? Me lembrou o Cânion Sussuapara no Jalapão, mas menos grandioso. E quando você já foi às cavernas do Petar (lógico ali, no sul do estado de SP) é mais difícil impressionar nesse quesito.

Mas o sol finalmente saiu e rumamos para (velho) Airão, a ruína de um vilarejo de 1694, que teve o seu auge na época da borracha, e hoje é guardada por um eremita japonês que mora lá. Pois é, japonês. Ceará contou que a namorada dele morreu antes deles casarem, ainda jovem, e que ele a visita todos os dias no cemitério da ruína. Hoje, ele passa os dias repetindo a história do lugar para cada visitante que chega e mostra, orgulhoso, fotos e matérias publicadas no New York times e Superinteressante. O pouco que sobrou do lugar, vem sendo “engolido” pela floresta com o passar do tempo. Galhos, troncos e cipós estão “abraçando” antigas paredes, escadas e portais, num clima de Angkor Wat, e se tornando parte da estrutura e da atração. Mas a igrejinha tá lá, intacta. E o japonês jurou que o padre vai lá rezar a missa todo mês. Uma viagem no tempo bem instigante!

Velho AirãoCeará colheu uns limões do quintal do japonês pro nosso peixe (com a devida permissão dele) e seguimos pro nosso destino (ufa): o Parque Nacional do Jaú.  De Novo Airão, 120km a oeste de Manaus, navegamos 96km (mais pra oeste) até a foz do rio Jaú, viramos à esquerda subindo 25km pelo próprio Jaú e depois mais 10km pelo rio Carabinani.  Ali, Jesus de Nazaré e seu irmão Ari têm um pedacinho de terra e moram num casebre à margem do rio. Entramos com o barco numa pequena baía, um tanto coberta pela floresta, estacionamos e subimos a ribanceira. No terreno construiram um telhadinho pra receber turistas, onde deixamos nossas coisas. Sim, telhadinho, porque não tinha qualquer parede.

Depois de um dia inteiro navegando com sol, chuva, muito filtro solar e repelente, estávamos exaustos, imundos e famintos.  Fomos tomar um banho. De rio, claro (nem eles têm banheiro). Mas com direito a sabonete! E jacaré… rs. Não, não vimos 🙁 mas disseram que são 3 filhotes. Por via das dúvidas, foi banho de baldinho e em cima de um “deck” de madeira.

Quando terminamos, Ceará tinha arrumado nossas redes, mosquiteiro, e Nazaré tinha feito o jantar: Tambaqui à lenha, com arroz e salada de tomate. Melhor peixe ever! Tô sonhando com ele até agora…

Ah! A onça? Bom, também não apareceu. Mas que eu fiquei aliviada em ver que eles têm 2 cachorros, eu fiquei. Ao menos latir pra avisar eles vão!

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